22/08/2025
As férias são um lugar interior. Aproveita-as. Foge de ti, desse Eu que viveu o ano todo no meio do nervo. Podes estar em filas na mesma, em aeroportos apinhados na mesma, em montes de pessoas num parque aquático. Tudo isso pode fazer parte das férias, se assim quiseres que faça. Mas foge por dentro, vive outra coisa por dentro.
As férias não são um álibi para continuar a mesma vida com cenário diferente. Por todo o lado, vejo pessoas a correr para a toalha como se fosse a última cama da UCI, a disputar lugares em restaurantes como se o prato de arroz de marisco fosse o Santo Graal. Se é para isto, não valia a pena terem saído de casa. O stress não desaparece com vista para o mar; muda de morada.
Eu não quero férias assim. Acho que ninguém devia querer férias assim. Quero a suspensão; não quero a repetição. Se é para viver o mesmo frenesim, poupo o dinheiro, poupo os quilómetros, poupo a paciência. É uma fraude chamar descanso ao prolongamento do inferno só porque o inferno agora tem areia e um sol de catálogo.
As férias são um estado mental. É desligar a maquinaria absurda que durante o ano nos mastiga, nos consome, nos cospe. Nas férias, é permitido falhar; acho até que é saudável falhar. Nas férias, quero falhar compromissos, chegar tarde, perder o lugar no restaurante, não ligar patavina ao trânsito. Nas férias, é o tempo o que faz as férias. Aproveitá-lo é nem olhar para ele, nem lhe dar importância. Estar. Há que desaprender a ser o animal domesticado da produtividade; há que reaprender a ser corpo, mar, sombra, pele salgada, sonos, sestas e cestas.
As férias existem quando conseguimos fazer, ou pelo menos sentir, aquilo que mais tememos: nada. O mais absoluto, o mais vergonhoso, o mais preguiçoso, o mais maravilhoso, nada. É lá, provavelmente pela primeira vez em meses, que podemos encontrar-nos outra vez.