04/08/2022
Eu tive uma infância bastante difícil, num ambiente deveras hostil. O meu lar, o meu ninho familiar, que deveria ser o meu refúgio, era o local onde eu sofria todos os tipos de humilhações. O meu pai Adinor e minha mãe, dona Quitéria, foram responsáveis pela criação de 9 filhos. Mas meus outros irmãos não passaram pelas coisas que eu passei.
A primeira vez em que tomei conhecimento do que se passava, foi com cerca de 4 anos. Durante o jantar, o caçula, ainda bebê, jogou a tigela de macarrão em mim, ficando eu, com aquele monte de macarrão na cabeça. Logo que comecei a chorar e tentar tirar o alimento de cima do meu couro cabeludo, o meu pai me mandou parar de mexer e correu para o quarto. Imaginei que ele iria pegar o cinto e ensinar bons modos para Dulcídio. Quando voltou do quarto, trouxe consigo a máquina fotográfica para tirar um foto de mim naquele estado.
Desde então, a minha vida não foi nada fácil. Se meu pai fosse corneado pela amante, ele me batia. Se o Corínthians perdia um jogo, quatro dos meus irmãos me batiam. Se um rapaz fosse mais rude com uma das minhas irmãs, tentando fazer s**o, ela chegava em casa e me batia. Minha mãe só me bateu uma vez, quando um bolo queimou.
Apesar de sofrido, foram bons ensinamentos, pois depois de crescido, e, iniciando a minha amizade com o álcool, passando a frequentar os bares, já me sentia preparado. Sabia que, diante de qualquer briga, já estaria preparado para apanhar.
Cansado de apanhar, me matriculei no Tae Kwon Do. Então, passei a apanhar também na academia.
Judith nunca me bateu; fora realmente uma santa. Vou expor um pouco a nossa intimidade: na hora do s**o ela gostava de bater. Mas tinha vezes em que exagerava, sempre deixando meus olhos roxos, quebrando alguns dentes, ou da vez em que deslocou a minha mandíbula.
Há 22 anos, no leito de morte da minha mãe, perguntei-lhe porque ela demonstrava ser a única pessoa da família que tinha afeição e amor, sem precisar me bater. Ela era uma católica bastante fervorosa, me respondendo de forma carinhosa: "A sua cara sempre pediu soco. Não teve um dia em que não tive vontade de te bater, mas eu tinha medo de ir pro inferno".