19/05/2025
VAMOS MUDAR DE FASE
Como pessoa com valores de formação humanista, democrata, de esquerda e subscritora do primado do método científico, o resultado das eleições deste dia 18 causou-me profundo desalento e estranheza.
Como eleitor de esquerda, as eleições causaram-me tristeza.
Como democrata, aceito sem rebuço as preferências do eleitorado e como cidadão compreendo o que interpreto como seu fundamento principal, divergindo totalmente na decisão.
Como cidadão, nada mudou: continuo comprometido com o objetivo da cidadania melhor informada que está na origem da iniciativa VamoLáVer.
E como editor desta newsletter, considero este um tempo apropriado para introduzir algumas melhorias, acompanhadas de uma chamada de atenção.
Três pressupostos:
1. este é um momento de reflexão para os partidos derrotados, sobretudo no lado esquerdo do hemiciclo. A VamoLáVer confia na capacidade de regeneração da democracia e aguarda pelas novas propostas e lideranças;
2. é também um momento para a resistência e a reorganização. Sejam partidos, grupos de pressão, think tanks, associações cívicas e outras estruturas ad hoc que podem vir ter vidas breves ou longas, da noite eleitoral saiu uma vontade de resistir — um movimento que extravasa as esquerdas e é mais abrangente, é também professo por figuras afetas às direitas, que colocam a sua pertença democrata acima das divisões ideológicas;
3. o jornalismo português vegeta há largos anos numa crise existencial e de identidade, tendo optado por perseguir traseiras de autocarros e ambulâncias para noticiar ad nauseum aspetos anedóticos do dia a dia — há um nome técnico, que é infotainment, ou info-entretenimento —, abandonando largamente as tarefas de escrutínio dos poderes, de denúncia dos casos alarmantes e de explanação e explicação dos problemas das populações e suas vidas e atividades.
Compreensível que possa ser a nossa atitude, o facto é que hoje os democratas perderam para o autoritarismo o seu histórico aliado. A procura de preencher o vazio do escrutínio levou, noutras paragens, a uma explosão de alternativas — em muitos casos jornalistas que abandonaram as empresas de comunicação social para continuarem a fazer jornalismo por conta própria ou em pequenas startups, noutros casos académicos com uma palavra a dizer nas suas áreas, noutros ainda cidadãos (como é o meu caso) com algumas competências em domínios da informação e suas tecnologias que procuram novos mecanismos de fiscalização ao serviço do coletivo, de forma remunerada ou pro bono.
Colocados os pressupostos, vamos aos três vectores de melhoria.
1. Aprofundar a fiscalização e o escrutínio por conta própria. Neste ano e meio dependemos do noticiário nacional para o grosso do seguimento da atividade política em Portugal. O filtro do essencial foi a principal mais valia da VamoLáVer. Já era insuficiente — e aos poucos fomos dando menos espaço a Portugal e mais espaço à União. Mas o que se desenha no futuro imediato, com os media — sobretudo as televisões — comprometidos com o infotainment, submetidos às lógicas mercantis e em demasiados casos fascinados com o populismo, levou o caso a outro patamar. Vamos investir algum tempo e esforço para aprimorar e aumentar a fiscalização das ações governativa e legislativa.
2. Procurar e recompensar o jornalismo de investigação e de explicação. Graças aos apoiantes, assinamos várias publicações, tanto convencionais como novas. Há muitas mais. Dois exemplos: em Portugal adicionar a Visão à nossa lista (já esteve, mas saiu) e internacionalmente apoiar a Follow the Money. Há outros na fila de espera, dependendo dos novos apoios que vão chegando.
3. Averiguar a possibilidade de uma rede, formal ou informal, de meios alternativos, começando pelas newsletters que já existem e pelas que deverão abrir nos próximos tempos. (É expectável que suceda, na micro-escala do país, uma explosão como sucedeu nos meios dos Estados Unidos, que se multiplicaram no Substack após o regresso de Trump ao poder.) O compromisso é dialogar com outros democratas com foco na cidadania, esperando que se chegue a algum tipo de colaboração entre meios.
Esta proposta de melhorias depende em larga medida do apoio dos leitores. Em graus diferentes, importam em custos financeiros — recordo que VamoLáVer não está orientada ao lucro e não tem publicidade nem nenhuma relação de dependência.
Ou seja: VamoLáVer precisa do seu apoio para mudarmos de fase, para termos melhor escrutínio dos futuros Governo e Parlamento, e ganhar independência face ao jornalismo em crise de identidade.
Todos os apoios contam.
O maior apoio é o financeiro. Pode mudar a sua subscrição de gratuita para apoiante, com as opções de 5 euros mensais ou 50 anuais.
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