
30/06/2025
O ENVELHECIMENTO : OBRAS DE LEITURA OBRIGATÓRIA
O Envelhecimento em Portugal e na Europa: O Papel da Psicologia do Envelhecimento no Bem-Estar e Autoestima dos Idosos e a sua Utilidade Social
O envelhecimento da população é uma realidade crescente em Portugal e na Europa. De acordo com dados do Eurostat, a população europeia está a envelhecer rapidamente devido ao aumento da esperança média de vida e à diminuição da taxa de natalidade.
Em Portugal, este fenómeno é particularmente acentuado, sendo um dos países com maior percentagem de população idosa na União Europeia.
Este cenário demográfico levanta desafios sociais, económicos e psicológicos, mas também oferece oportunidades para repensar o papel dos idosos na sociedade.
Neste contexto, a psicologia do envelhecimento assume um papel fundamental na promoção do bem-estar e autoestima da população sénior.
Neste Texto propomos uma breve análise do envelhecimento em Portugal e na Europa, o contributo da psicologia na melhoria da qualidade de vida dos idosos e a forma como estes podem continuar a ser membros ativos e úteis da sociedade.
Propomos ainda a leitura indispensável de alguns autores e obras publicados pelas edições Piaget que foi pioneira na publicação deste tema nos idos de 90 do seculo passado, dando a conhecer ao leitor lusófono a importância do grande Ladislas Robert nesta área e hoje já um pouco esquecdido
O Envelhecimento em Portugal e na Europa: Um Enquadramento Demográfico
O envelhecimento demográfico traduz-se no aumento da proporção de pessoas com 65 ou mais anos na população total. Em 2024, cerca de 23% da população portuguesa era composta por idosos, com projeções que apontam para um aumento contínuo nas próximas décadas.
A nível europeu, este fenómeno é igualmente significativo, afetando tanto países do sul (como Itália, Grécia e Portugal) como países do norte e centro da Europa.
As causas principais incluem:
• Aumento da longevidade, resultado dos avanços na medicina e condições de vida.
• Redução da taxa de natalidade.
• Emigração de populações jovens em alguns países.
Este panorama implica uma pressão crescente sobre os sistemas de saúde, segurança social e políticas públicas, exigindo soluções integradas e inovadoras.
A Psicologia do Envelhecimento e a Promoção do Bem-Estar subjetivo e Auto Estima nos idosos
A psicologia do envelhecimento é uma subdisciplina da psicologia que estuda os processos psicológicos ao longo da vida, com especial atenção às mudanças cognitivas, emocionais e sociais associadas ao envelhecimento.
Esta área desempenha um papel crucial na promoção do bem-estar psicológico dos idosos, nomeadamente através de:
• Promoção da autoestima: Muitos idosos enfrentam sentimentos de inutilidade, isolamento e perda de identidade após a reforma ou devido à fragilidade física. A intervenção psicológica pode ajudar a reconstruir uma imagem positiva de si próprios, valorizando a experiência de vida e os contributos passados.
• Prevenção de problemas de saúde mental: A depressão e a ansiedade são frequentes nesta faixa etária. Técnicas cognitivas-comportamentais e terapias de suporte têm demonstrado eficácia na redução do sofrimento psicológico.
• Promoção do envelhecimento ativo: A psicologia pode facilitar estratégias para manter os idosos mental e socialmente ativos, reforçando o sentido de propósito e de pertença.
• Intervenções em grupos e comunidades: Os programas psicoeducativos, atividades intergeracionais e grupos de suporte ajudam a mitigar a solidão e fortalecer as redes sociais dos idosos.
A Utilidade Social dos Idosos: Um Recurso ainda Inexplorado
Contrariando estereótipos que veem os idosos como dependentes ou improdutivos, a realidade mostra que esta população pode ser um recurso valioso para a sociedade. A utilidade dos idosos manifesta-se em diversas áreas:
• Transmissão de conhecimento e valores: Os idosos são portadores de saberes acumulados, histórias de vida e valores culturais essenciais para a identidade e coesão das comunidades.
• Voluntariado e solidariedade: Muitos idosos envolvem-se em atividades de voluntariado, apoiando instituições sociais, escolas e lares, contribuindo ativamente para o bem-estar comum.
• Apoio intergeracional: Os avós desempenham frequentemente um papel central no apoio às famílias, nomeadamente na educação dos netos, o que permite aliviar as cargas parentais e promover laços afetivos profundos.
• Participação cívica e política: Um número crescente de idosos participa em associações, grupos de defesa dos direitos dos seniores e em iniciativas de cidadania ativa.
Em suma, O envelhecimento é um fenómeno multifacetado que exige respostas articuladas inter e trandisciplinarmente, políticas públicas e sociedade civil.
Portugal e a Europa enfrentam desafios significativos com o envelhecimento populacional, mas também têm a oportunidade de redefinir o lugar do idoso na sociedade contemporânea. A psicologia do envelhecimento oferece ferramentas essenciais para promover o bem-estar, a autoestima e a integração dos idosos.
Reconhecer a utilidade social desta faixa etária é não apenas uma questão de justiça, mas também de sustentabilidade e enriquecimento coletivo.
A construção de sociedades inclusivas passa, inevitavelmente, por valorizar o envelhecimento como uma etapa digna, ativa e cheia de potencial.
Contributos de Ladislas Robert, Zaida Azeredo e Patrick Lemoine para o Estudo do Envelhecimento: Perspetivas Médicas, Psicológicas e Humanistas
O envelhecimento é um fenómeno complexo que ultrapassa as fronteiras da biologia, estendendo-se ao domínio psicológico, social e cultural. A compreensão desta etapa do ciclo vital tem sido aprofundada por vários investigadores e profissionais de diferentes áreas. Entre eles destacam-se Ladislas Robert, Zaida Azeredo e Patrick Lemoine, cujas obras – publicadas pelas Edições Piaget - têm influenciado significativamente a forma como se pensa e atua em relação à velhice. Aqui tentamos explorar os principais contributos destes autores para o estudo do envelhecimento, analisando as suas perspetivas sobre a saúde, a dignidade, a subjetividade e o papel da sociedade na vida do idoso.
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Ladislas Robert: A Medicina Humanista ao Serviço da Velhice
Ladislas Robert (1913–2007), médico húngaro radicado em França, foi um dos pioneiros da medicina social e preventiva na Europa. A sua obra é profundamente marcada por uma visão humanista da saúde, onde o envelhecimento é entendido não como uma doença, mas como um processo natural da existência. Por mais de uma vez Ladislas Robert esteve em Congressos e Jornadas organizadas pelo Instituto Piaget onde transmitiu todo o seu conhecimento, saber e teorias sobre o tema. As suas palestras estão publicadas na Revista Aprendizagem /desenvolvimento publicada pelo Instituto Piaget.
Robert destacou-se ao denunciar o idadismo médico, ou seja, a tendência da medicina moderna para ignorar ou desvalorizar os sintomas dos idosos. Para ele, a velhice exigia uma abordagem específica e integrada, que combinasse respeito pela pessoa, atenção à sua história de vida e uma escuta ativa dos seus sofrimentos físicos e emocionais. Defendia ainda que o envelhecimento não deveria ser medicalizado em excesso, mas acompanhado com empatia e dignidade, reconhecendo o valor da experiência e da sabedoria acumuladas.
O seu legado permanece atual ao influenciar práticas médicas mais éticas e centradas no paciente idoso, e ao promover uma visão não-discriminatória da longevidade, em oposição à lógica produtivista que marginaliza os não-produtivos.
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2. Zaida Azeredo: A Psicologia do Envelhecimento e a Dignidade do Sujeito
Zaida Azeredo, com vasta produção na área da psicologia do envelhecimento, é uma referência fundamental na América Latina e no mundo lusófono. A sua abordagem centra-se no respeito pela subjetividade do idoso, valorizando os aspetos emocionais, afetivos e identitários da velhice.
Para Zaida Azeredo, envelhecer não é apenas lidar com perdas, mas também reconstruir significados, reformular identidades e procurar novos propósitos. A sua obra realça o papel da autoestima, da autonomia e das redes de suporte social como pilares do envelhecimento bem-sucedido. Zaida Azeredo critica os modelos patológicos e deficitários que veem o envelhecimento como declínio inevitável, e propõe, em alternativa, uma perspetiva de envelhecimento ativo e positivo.
Um dos seus principais contributos é a ênfase na educação para o envelhecimento, que deve começar desde a juventude, para combater preconceitos e preparar emocionalmente os indivíduos para essa fase da vida. Azeredo também sublinha a importância das políticas públicas, da inclusão social e do diálogo intergeracional como estratégias fundamentais para garantir qualidade de vida aos idosos.
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Patrick Lemoine: O Sono, a Saúde Mental e o Cérebro no Envelhecimento
Patrick Lemoine, médico psiquiatra francês, tem uma vasta obra dedicada aos temas da saúde mental, do sono e da neurociência aplicada ao envelhecimento. As suas investigações têm sido fundamentais para compreender como os aspetos neuropsicológicos afetam a qualidade de vida dos idosos.
Lemoine é especialmente conhecido pelo estudo dos distúrbios do sono, que afetam grande parte da população idosa. Demonstra, nas suas investigações, como o sono de má qualidade pode agravar problemas como depressão, demência e fragilidade física.
A sua abordagem, ao envelhecimento, destaca a importância de estratégias não-farmacológicas para promover o sono saudável e a saúde mental, tais como a higiene do sono, terapias cognitivas e técnicas de relaxamento.
Outro contributo relevante de Lemoine é a sua crítica à psiquiatrização excessiva da velhice, propondo práticas médicas mais sensíveis às especificidades cognitivas e emocionais dos idosos. O autor também explora as relações entre envelhecimento cerebral e identidade, defendendo uma visão holística da pessoa idosa, que valoriza a sua história, relações sociais e desejos, mesmo em contextos de declínio cognitivo.
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As contribuições de Ladislas Robert, Zaida Azeredo e Patrick Lemoine para o estudo do envelhecimento são fundamentais para a construção de uma abordagem multidimensional, humanizada e ética da velhice. Robert trouxe uma crítica poderosa à desumanização médica; Azeredo reforça a centralidade da subjetividade e da dignidade na psicologia do envelhecimento; Lemoine, por sua vez, oferece perspetivas neurocientíficas integradas sobre saúde mental e bem-estar.
As suas obras mostram que o envelhecimento deve ser encarado como uma etapa legítima e rica da vida, e não como um fardo social ou individual. Ao promoverem o respeito, a escuta e a valorização da pessoa idosa, estes autores abrem caminho para uma sociedade mais justa, mais inclusiva e mais sábia, onde envelhecer seja sinónimo de continuidade, dignidade e possibilidade.
Síntese das Obras de Ladislas Robert, Patrick Lemaire e Zaida Azeredo sobre o Envelhecimento e publicadas pelas Edições Piaget
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1. Ladislas Robert: Uma Visão Humanista e Crítica do Envelhecimento
a) Envelhecimento: Factos e Teorias
Nesta obra, Ladislas Robert apresenta uma análise crítica dos principais modelos explicativos do envelhecimento, distinguindo entre abordagens biológicas, psicológicas e sociais. O autor destaca que, embora existam teorias que associam o envelhecimento ao desgaste físico inevitável (como a teoria do envelhecimento celular ou da entropia), estas não explicam a heterogeneidade dos percursos de envelhecimento.
Robert propõe uma compreensão multitransdisciplinar e humanista, onde o envelhecimento deve ser visto como parte da trajetória existencial do sujeito, e não apenas como deterioração funcional. Sublinha ainda a importância de contextos sociais e culturais na vivência do envelhecimento, defendendo políticas públicas que respeitem a dignidade do idoso.
b) O Envelhecimento
Esta obra aprofunda a crítica à visão biomédica e produtivista da velhice. Robert argumenta que a sociedade moderna, centrada na produtividade e juventude, tende a marginalizar os idosos. Propõe uma reconfiguração do olhar clínico, que deve integrar a escuta, a empatia e o reconhecimento do valor simbólico e afetivo do idoso.
Destaca a necessidade de formação específica em geriatria humanizada, onde o cuidado vai além da técnica e se inscreve numa ética do respeito. É um contributo fundamental para repensar a relação entre medicina e envelhecimento, no quadro de uma justiça gerontológica.
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2. Patrick Lemaire: Envelhecimento Cognitivo e Estratégias de Adaptação
a) Psicologia do Envelhecimento
Patrick Lemaire aborda os impactos do envelhecimento sobre as funções cognitivas — atenção, memória, raciocínio, tomada de decisão — mostrando que o declínio não é uniforme nem inevitável. A obra demonstra que, apesar de algumas perdas cognitivas com a idade, existem mecanismos de compensação e plasticidade cerebral, sobretudo quando estimulados em ambientes ricos e favoráveis.
A psicologia do envelhecimento, segundo Lemaire, deve concentrar-se não só no diagnóstico das perdas, mas na promoção de estratégias adaptativas, como o treino cognitivo, a aprendizagem ao longo da vida e a participação ativa em contextos sociais estimulantes.
b) Envelhecimento Cognitivo e Adaptações Estratégicas
Esta obra complementa a anterior, com foco nas estratégias mentais utilizadas pelos idosos para manter o desempenho cognitivo. Lemaire demonstra, com base em investigação empírica, que os idosos usam estratégias distintas — mais lentas, mas mais eficazes — para resolver problemas complexos, revelando sabedoria prática e flexibilidade adaptativa.
O autor defende que o envelhecimento não deve ser reduzido a perda, mas compreendido como uma fase de reestruturação estratégica do funcionamento mental, onde a experiência acumulada compensa, muitas vezes, o declínio de certas capacidades.
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3. Zaida Azeredo: Perspetiva Sociocultural e Cidadania no Envelhecimento
a) Envelhecimento, Cultura e Cidadania
Zaida Azeredo explora o envelhecimento como uma construção sociocultural. A autora argumenta que as experiências de envelhecer são moldadas pela cultura, género, classe social e pertença étnica, desafiando modelos homogéneos de envelhecimento.
A obra valoriza o conceito de cidadania gerontológica, segundo o qual os idosos devem ser reconhecidos como sujeitos de direitos, agentes ativos na sociedade e não apenas como objetos de cuidado. Azeredo propõe políticas que promovam inclusão, participação e reconhecimento simbólico dos idosos na vida pública.
b) Envelhecimento Ativo: Processo Sociocultural
Neste livro, Azeredo aprofunda o conceito de envelhecimento ativo como um fenómeno relacional e contextual, não apenas ligado à atividade física ou ocupacional. A autora critica abordagens individualistas e biomédicas, propondo uma perspetiva ecossocial, onde a qualidade de vida do idoso depende da sua inserção em redes de apoio, acessibilidade urbana, acesso à cultura e educação continuada.
O envelhecimento ativo, para Azeredo, é um processo de negociação simbólica com o tempo, os papéis sociais e os espaços de pertença, exigindo mudanças estruturais nas mentalidades e instituições.
c) A Diversidade no Envelhecimento
Esta obra reforça a crítica à visão uniforme da velhice. Azeredo argumenta que envelhecer é uma experiência profundamente marcada pela diversidade de trajetórias, identidades e contextos sociais. A autora enfatiza que não existe “o idoso”, mas múltiplas velhices, com diferentes desafios, recursos e formas de expressão.
A valorização da diversidade implica reconhecer formas não normativas de envelhecer (por exemplo, idosos com deficiências, idosos pobres), promovendo políticas interseccionais e culturalmente sensíveis. A obra é um apelo à equidade no envelhecimento, onde todos possam envelhecer com dignidade, independentemente das suas origens ou condições.
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Conclusão
As Edições Piaget ao publicarem as obras de Ladislas Robert, Patrick Lemaire e Zaida Azeredo oferecem perspetivas complementares e inovadoras sobre o envelhecimento uma vez que , Robert apresenta uma crítica ética à desumanização médica; Lemaire investiga a resiliência cognitiva e as adaptações mentais associadas à velhice; Azeredo propõe uma leitura sociocultural e crítica da velhice, enfatizando a diversidade, cidadania e inclusão.
Juntas, estas obras permitem construir uma abordagem interdisciplinar, humanizada e justa do envelhecimento, essencial para responder aos desafios demográficos e sociais do século XXI.
Obras do Fundo Editorial das Edições Piaget que são de leitura obrigatória por profissionais, estudantes e o publico geral que devem alargar os seus conhecimentos sobre o tema
© Ana Paula de Viveiros, 30 de Junho de 2025
Fontes :
Viveiros, Ana-Paula. O papel do Animador Sociocultural no bem –estar subjetivo e autoestima das pessoas idososas, 2005 (Tese de Mestrado)
Todas as obras mencionadas.,
Destacar
̧ãosociocultural ̧ãosocial