08/05/2025
Crônica Jornalística: “Quando a Juventude Pegou no Batuque da Saúde”
No coração do Cunene, nos musseques de Ombadja entre caminhos de terra batida e as vozes das mamás a ralhar com os miúdos ao cair da tarde, havia um silêncio estranho. Não era o silêncio da paz, mas o da preocupação. A cólera tinha regressado como uma visita indesejada, daquelas que se instala sem bater à porta e que rouba, sem cerimónia, a alegria dos dias.
As latrinas improvisadas mal davam conta do recado, e a desinformação andava de braço dado com o medo.
Foi quando surgiu o Q**m , mas todos o chamavam Q**m do 7 de Abril, porque foi nesse dia que ele voltou do seminário juvenil da vila com a cabeça cheia de ideias e o peito inchado de vontade. Tinha aprendido sobre associativismo juvenil, sobre como os jovens podem, juntos, fazer muito mais do que apenas esperar por promessas.
“Se o governo não chega, nós é que vamos ao governo!”, dizia ele, olhos acesos como brasa nova.
Q**m começou a chamar os amigos. Vieram poucos, no início. Mas bastou uma reunião debaixo do mulemba grande para a chama acender. Nasceu a Associação Juventude Unida pela Vida — AJUV, como logo se passou a chamar. Receberam formações com técnicos de saúde e Aprenderam a tratar a água com lixívia, a construir latrinas melhoradas e, o mais importante, a educar sem humilhar.
Iam de casa em casa, às vezes com megafone emprestado da escola, às vezes apenas com a coragem. Levaram sabão, panfletos, mas também levaram empatia. Ensinaram os miúdos a lavar as mãos com jeito de quem conta uma estória. Falaram com os mais velhos como se fossem seus pais, com respeito, mas com firmeza.
Pouco a pouco, o número de casos foi caindo. O posto de saúde passou dias sem internamentos.
Hoje, a cólera já não ronda a banda. A água agora bebe-se tratada. As latrinas estão mais longe dos poços.E o Q**m? Diz que se cada comunidade tiver um grupo de jovens despertos, nem o diabo da cólera aguenta.