08/07/2025
𝗢 𝘀𝗶𝘀𝘁𝗲𝗺𝗮 𝗲𝘀𝘁𝗮́ 𝗽𝗼𝗱𝗿𝗲 𝗲 𝗼 𝗽𝗼𝘃𝗼 𝗰𝗼𝗻𝘁𝗶𝗻𝘂𝗮 𝗮 𝗽𝗮𝗴𝗮𝗿
Quando cidadãos manifestam preocupações legítimas sobre as condições socioeconómicas do país, somos imediatamente chamados de “Revús” — Revolucionários — como se reclamar por justiça social fosse um crime.
Pessoas próximas, amigos, colegas, vizinhos e até familiares rapidamente assumem que somos da UNITA ou que estamos a conspirar para desestabilizar o país. Há um esforço constante para nos excluir do debate político, sob o pretexto de que “isso é para os governantes”. Ora, mesmo que eu fosse militante da UNITA, da CASA-CE, do Bloco Democrático, do PRA-JÁ ou de qualquer outro partido da oposição, continuo a ser angolano. E é inaceitável que a cidadania plena seja condicionada pela filiação partidária. Sem xenofobia, o português, o moçambicano, o brasileiro e o cabo-verdiano são tratados como irmãos; por que então o próprio angolano é marginalizado quando pensa diferente?
A verdade é que a realidade do país fala por si. Os dados mais recentes confirmam que o contexto económico exige reflexão colectiva, diálogo honesto e coragem para enfrentar os problemas com frontalidade. Nos últimos meses, registou-se uma escalada brutal de preços que afecta directamente a vida do cidadão comum. As propinas no Ensino Superior estão sendo aumentadas em várias instituições públicas e privadas, como resposta ao agravamento dos custos operacionais causado por uma inflação descontrolada.
O gasóleo, sem os antigos subsídios, ultrapassa os 400 kwanzas por litro, encarecendo o transporte e pressionando toda a cadeia de consumo.
Os táxis colectivos (azul e branco) cobram agora, em média, 300 kwanzas por viagem, enquanto o autocarro público custa 200 kwanzas por viagem. A ENDE e a EPAL preparam novos aumentos nas tarifas de energia e água, e os serviços privados como a ZAP e a DSTV anunciarão actualizações de preços que parecem seguir a mesma lógica inflacionista.
A Unitel e a Africell, por sua vez, também vão reajustar os preços dos seus pacotes e serviços móveis — mais uma dor de cabeça para os cidadãos.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), o sector alimentar é o principal responsável pela inflação, que em Dezembro de 2024 atingiu 27,5%, o valor mais alto dos últimos oito anos. Em Março de 2025, o índice ainda se mantinha nos 23,85%, apesar das previsões do Banco Nacional de Angola, que promete — com pouco realismo — uma redução para 17,5% até ao final do ano. Enquanto isso, o kwanza segue a sua trajectória de queda face às moedas internacionais, e o poder de compra das famílias afunda a cada semana.
Muitos que antes nos chamavam de “negativistas”, “agitadores” ou “inimigos da paz” hoje começam a admitir, mesmo que em silêncio, que estávamos certos. As consequências estão à vista: um país com os recursos de Angola mergulhado numa crise de gestão, de prioridades e, sobretudo, de consciência política.
E que fique claro: o problema de Angola não são as empresas, nem os indivíduos — é o sistema. E esse sistema, liderado há quase meio século pelo MPLA, está podre. Podem vir os “Messis” e os “Cristianos Ronaldos” da política, mas se não se mudar o sistema, a engrenagem engole qualquer boa intenção. A crise que vivemos não é apenas económica, é também moral e estrutural. E enquanto o sistema se mantiver intacto, o povo continuará a pagar a conta.
Por: Dário de Castro - CEO do Angola Transparente