29/04/2025
Carta para minha mãe
Mamãe,
Hoje faz um mês. 29/04/2025
Um mês que estou vivendo sem você. Um mês que você partiu, porque seu corpo já não conseguia mais permanecer aqui.
E eu fiquei... Fiquei aqui, sem você.
Está sendo difícil, mãe. Depois de ter passado mais de meio século ao seu lado, vivendo com você, falando com você, sonhando, fazendo planos, divergindo, construindo... é difícil.
Fomos muito mais do que mãe e filha. Muito mais do que aquela que deu à luz e aquela que foi concebida.
Éramos confidentes, amigas, leais e sinceras.
Acredito que eu tenha sido a pessoa que mais discordou de você nesta vida (risos). Que mais te questionou (mais risos).
Lembra quando você reclamava que não lembrava das coisas? Eu ria e falava: “ Deus é bom, você tem sorte por não lembrar”. (risos) "Isso porque eu lembro! Eu lembro de tudo!" — e começava a contar as histórias, enquanto você, pela milésima vez, se chocava e ria comigo.
E você dizia: "Deus é bom mesmo!" (risos).
Passávamos horas assim, conversando, rindo, comentando das histórias dos outros, lembrando da nossa caminhada, e você me fazia perguntas que poucas mães têm coragem de fazer a uma filha.
E eu respondia tudo, tirava todas as suas dúvidas, sem reservas.
E, quando a memória te falhava, você dizia: "Fala você, Flávia, você lembra melhor que eu."
É, mãe... você se foi.
Mas toda a sua história, tudo o que vivemos juntas — na alegria, na tristeza, na saúde, e na doença — continua aqui, intacto em mim.
Cada olhar, cada palavra, cada gesto seu está guardado em mim.
Até os seus pensamentos, mãe, eu conhecia tão bem que ainda hoje eu busco suas respostas dentro de mim.
Essa memória é o que me faz chorar de saudade, mas também sorrir de gratidão e felicidade por termos vivido tudo isso juntas.
Se há algo de que me arrependo é de não ter atendido seu último pedido: o de deitar na maca com você no hospital.
Eu tive medo. Medo de te machucar, medo de te causar alguma dor.
Jamais, jamais mesmo, imaginei que aquele seria o nosso último momento juntas, o nosso último dia.
Nós, que tantas vezes deitamos juntas, lado a lado, dividindo sonhos e medos...
Mãe, também quero te pedir perdão. Perdão por ter judiado de você naquela última noite, cantando quase a madrugada inteira para tentar te acalmar (risos).
Você sabe — como cantora, eu sou uma excelente escritora! (mais risos).
Mas foi o jeito que encontrei de estar com você, de não te deixar sozinha nem por um segundo.
Hoje, sigo aqui, mamãe, ouvindo sua voz em mim.
Busco suas respostas nas minhas memórias.
Vou cuidar do pai, do centro e de todas as pessoas pelas quais você se preocupava.
E quando chegar a minha hora, espero te encontrar, com esse seu sorriso aberto e cativante, me esperando. E poder ser a sua mãe na próxima vida, como eu sempre falava pra você, lembra?
Enquanto isso, se Deus te permitir, venha me visitar de vez em quando, para matar um pouquinho da saudade.
Fique em paz, mãe.
E saiba que cada dia que eu viver será honrando tudo o que você me ensinou.
Como você sempre dizia: Muito obrigada por cuidar tão bem de mim.
E eu te respondo hoje, como tantas vezes você me disse: Eu te amo tanto!
Para sempre, sua filha,
Flávia