
15/06/2024
Vou contar uma história, uma das lendas mágicas do Centro de Lazer SESC Fábrica da Pompéia (como chamava então). Eu quase nunca falo delas, mas ontem o Skowa morreu, e é para ele, e para quem o amava, que vou lembrar. Era 1983, um farol misterioso de alegria e arte tinha sido aceso na velha fábrica, todos os vagalumes da cidade estavam lá. Nesse embalo começou um programa de Grandes Festas com Grandes Bandas (Paulo Moura deu a primeira, no aniversário da cidade, Noite do Preto e Branco). No Rio de Janeiro, no Circo Voador, um dos sucessos eram as noites de salsa: moravam lá os músicos de uma big band de panamenhos/costariquenhos/caribenhos que estava em alta, e eu, que era o cabeça da programação, fui propor ao diretor, o Stan, que fizéssemos também nós uma noite tropical e musical de swingue e arrasta-pé. Era, digamos assim, uma ideia calorosa. Ele topou e anunciamos, pondo a boca no trombone, quer dizer, no boletim das atividades do mês. Mas quando levei a conta dos cachês, mais as passagens (a banda era big...), mais o hotel, mais a alimentação da turma toda, o que ouvi foi um redondo “não”. Daí fiquei mal: estava anunciado, eu achava importante manter palavra dada, sai sem rumo pela rua central da Fábrica e cruzei com o Chico Milan, que trabalhava comigo, e que deu a seguinte esperança pra minha angústia: “Conheço um cara que se virou em Paris tocando salsa...” Pedi pra me apresentar, o Chico trouxe a figura, e era ele: o Skowa. Perguntei: “você consegue montar uma banda de salsa pra animar uma festa daqui a duas semanas?” Não preciso nem dizer que ele topou, não é? E eu ainda disse: “Em uma semana quero ir ouvir o ensaio”. Topou também, claro. Daí voltei no Stan: “e se a gente arranjar uma banda daqui mesmo, sem passagens de avião, nem hotel, nem estadia?”. Ele falou: “Se você arranjar isso, tudo bem...” Uma semana depois o Chico Milan me levou, era um sábado, pra me apresentar o som, numa casa que, lembro, ficava bem longe. E assim nós dois fomos os primeiros ouvintes, ao vivo, da banda Sossega Leão: Hamilton Moreno, Adriano “Japonês”, Guga Stroeter, Chico Guedes, Edu “Cabello”, Fernando Marconi, Cláudio ‘Gato” Faria, Matias Capovilla, Marcelo Tuba, Dorival Galante, Alaor, e de band leader, ele – o Skowa! E na noite combinada, ao som de “Tequila”, “Caribe, Ei?” e outros balanços calientes feito um mojito, com folhas de palmeira “importadas” do Sesc Interlagos vestindo as colunas da choperia, as mesas (pesadíssimas) postas de lado, o palco iluminado, a pista na penumbra, e uma enorme bandeira da Jamaica no fundo do palco (que sumiu no fim da festa, nunca mais achamos), umas 800 pessoas dançaram sem parar na primeira Festa do Caribe. E quando, em 85, saiu o primeiro disco do Sossega (esse aí, nas fotos), que abriu o caminho da onda de sucesso das big bands dos anos 80, o Skowa pôs a gente lá, nos agradecimentos, o Chico Milan e eu. Bom, meu velho, chegou a hora de te retribuir. De pormos nós o teu nome valente nos agradecimentos, por tanta música, e festa, e risos, e ânimo, e namoros, e sonhos, que você salpicou por esse mundo. Obrigado, querido Skowa, pelo teu coração cantante. Só contei a lenda pra honrar você, e acho que posso terminar com as palavras do Gil: “muita gente me pergunta / se essa história aconteceu... / aconteceu, minha gente / quem tá contando sou eu”. Abraço forte, meu irmão, e até um dia.