
29/07/2025
JORNALISMO INVESTIGATIVO DIZ ADEUS A MARCELO BERABA
O jornalismo investigativo brasileiro despede-se de uma de suas referências mais sólidas e respeitadas, Marcelo Beraba. A Associação Goiana de Imprensa (AGI) reconhece e agradece a dedicação desse profissional ao longo de décadas.
“Beraba consolidou sua trajetória com reportagens que marcaram época, sempre pautadas pela busca rigorosa da verdade, pelo compromisso com a ética e pelo respeito ao interesse público”, ressalta o presidente da entidade nonagenária, Valterli Guedes.
Fundadores da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o jornalista Marcelo Beraba morreu na tarde desta segunda-feira (28), aos 74 anos. Ele estava internado no Hospital Copa D'Or, em Copacabana, Zona Sul do Rio.
Beraba descobriu um câncer no cérebro em março e chegou a passar por uma operação. Ele deixa duas filhas, dois enteados e três netos. O velório será no memorial do Carmo, no Cemitério do Caju, na quarta-feira, 30, entre 12h30 e 15h30.
O jornalista de dois casamentos teve duas filhas, Ana Luíza e Cecília, e outros dois que a vida lhe trouxe, João e Olívia, que deram a ele os três netos por quem era apaixonado.
Ele foi diretor do Grupo Estado, em Brasília. Trabalhou também na TV Globo, no jornal O Globo, no Jornal do Brasil e na Folha de S.Paulo, onde exerceu, entre outras, a função de ombudsman.
Beraba foi o primeiro presidente da Abraji, fundada por ele e outros jornalistas como resposta ao assassinato de Tim Lopes. Recebeu em 2005 o Prêmio Excelência em Jornalismo do ICFJ (International Center for Journalists).
A tarefa de guardião da ética no jornalismo, que tomou para si, era quase uma obsessão. Beraba desenvolveu técnicas meticulosas no planejamento de grandes coberturas e era extremamente rigoroso com a checagem de dados, muito antes da explosão das fakes news e das redes sociais. Nas cobranças por precisão era severo, mas nunca desrespeitoso, ao contrário, com frequência baixava o tom de voz.
Ainda bem jovem, Marcelo Beraba deu um furo de reportagem que até hoje tem reflexos na política brasileira e serviu, naquele momento, para mostrar publicamente o método do regime militar.
Foi em O ano era 1981 e, apesar da anistia política de dois anos antes, o Brasil ainda vivia sob o regime militar quando uma bomba explodiu dentro do carro ocupado por dois militares do Exército no estacionamento do Riocentro, onde milhares de jovens acompanhavam shows de música do 1º de Maio, embalados pelo ideal de redemocratização.
A explosão matou, na hora, o sargento Guilherme do Rosário e feriu gravemente o capitão Wilson Machado, agentes do Doi-Codi. Beraba foi um dos primeiros repórteres a chegar ao local e acabou conseguindo, com um dos médicos que acompanharam o atendimento hospitalar do capitão Wilson, o filme com as imagens da cirurgia.
As fotos, junto com a informação vinda de Brasília de que eram duas e não apenas uma bomba, serviram para comprovar que a intenção dos militares era forjar um atentado que seria atribuído a comunistas para evitar o processo de retorno ao regime democrático.
A diretora do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, Rosental Calmon Alves, recorda-se do estilo de liderança de Barba, baseado sobretudo no diálogo sincero, na transparência, na paciência para escutar e na habilidade de encontrar pontos comuns e conciliação no meio de divergências que pareciam irreconciliáveis.
De acordo com Ricardo Uceda, diretor do IPYS – Instituto Prensa y Sociedad, o falecimento de Beraba é profundamente triste para o IPYS e para a comunidade da Conferência Latino-Americana de Jornalismo Investigativo (COLPIN), da qual foi um dos fundadores e do Prêmio Latino-Americano, onde atuou como jurado por mais de dez anos. Seu papel foi decisivo na relação entre jornalistas brasileiros e latino-americanos, inexistente há duas décadas.
Ao longo de sua carreira, Beraba formou gerações de jornalistas, não apenas por meio de suas reportagens emblemáticas, mas também pelo papel como mentor e editor. Compartilhava conhecimento, incentivava o pensamento crítico e defendia a liberdade de imprensa como pilar fundamental da sociedade. Seu olhar atento para os bastidores do poder e sua habilidade em revelar o que estava oculto inspiraram profissionais em todo o país.
Ao se despedir de Marcelo Beraba, o jornalismo investigativo reconhece não só a perda de um grande profissional, mas celebra a herança de integridade, coragem e dedicação à verdade que ele deixa para as futuras gerações. Seu legado é uma referência constante para quem acredita no papel transformador da informação e na necessidade de um jornalismo comprometido com a sociedade. A jornada de Marcelo Beraba permanece como exemplo vivo de que a busca pela verdade e o respeito à ética são caminhos indispensáveis para o jornalismo que deseja ser digno de sua missão.
(FOTO - reprodução)
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