29/09/2025
Festival Fala Quilombo: Resistência Ancestral Ocupa o Centro de Itabira e Afirma um Futuro Coletivo
O Maior Encontro de Culturas Periféricas e Ancestrais de Minas
O centro de Itabira, em Minas Gerais, transformou-se em um epicentro vibrante de resistência e celebração cultural entre os dias 26 e 28 de setembro. A 4ª edição do Festival Fala Quilombo, organizado pelo Instituto Fala Quilombo, consolidou-se como o maior encontro cultural quilombola, indígena e periférico do estado, reunindo uma impressionante estimativa de 6 mil pessoas. Mais do que um evento, o festival se estabeleceu como um poderoso ato político e social, acolhendo cerca de 90 comunidades de diversos territórios em uma programação inteiramente gratuita e diversificada.
Este ano, o movimento deu um passo histórico ao deixar o ambiente universitário das edições anteriores para ocupar, pela primeira vez, o coração geográfico e simbólico de Itabira. A decisão estratégica, impulsionada pelas próprias comunidades, conferiu ao festival um significado ainda mais profundo. Lydiane Souza, mestranda em Antropologia pela UFMG e produtora executiva do evento, enfatizou a dimensão dessa mudança.
"As edições anteriores foram na universidade, mas entendemos que era hora de ocupar o centro. Foi a primeira vez que vi tanta gente preta e periférica nesse espaço," destacou Lydiane, sublinhando que este é um movimento de resistência política que resgata a ancestralidade para guiar novos caminhos. "Isso é político, é resistência. O Fala pertence às comunidades e também à população de Itabira."
O Festival que "Precisa Existir": Conexão, Força e Imaginação Política
A realização do Fala Quilombo é, em si, um testemunho de anos de luta e trabalho coletivo. Para Lydiane Souza, o festival transcende a mera festa, sendo o resultado de uma resiliência incansável: “Foi um grande desafio. Conseguimos colocar mais uma edição na rua. É emocionante ver a chegada das comunidades e perceber que o festival segue existindo porque precisa existir.”
O festival se configura como um espaço crucial para a imaginação política e a construção de um futuro almejado. Ao conectar comunidades historicamente marginalizadas, o encontro não apenas celebra suas tradições, mas forja uma visão de mundo coletiva. Segundo Lydiane, o Festival Fala Quilombo projeta um porvir "coletivo, confluente, extremamente preto, indígena e periférico."
Essa visão estratégica frente às adversidades foi traduzida em uma metáfora poderosa: “Se o racismo se sofisticou, o que fazemos aqui é uma sofisticação maior ainda das tecnologias de resistência ancestral”, afirmou Lydiane. O evento se torna, portanto, um laboratório de futuro, onde a sabedoria ancestral é a principal ferramenta para combater as opressões contemporâneas.
A Força da União e a Renovação das Lideranças
A união das diversas frentes — quilombolas, indígenas e comunidades periféricas — foi um dos pontos altos desta edição. Marlene Matheus, coordenadora da Comissão das Comunidades Quilombolas do Rio Doce, ressaltou a importância desse laço de solidariedade e luta. “Essa mistura deu ainda mais força ao movimento. Quando a gente se une, consegue combater o sistema que nos oprime e exclui o tempo inteiro,” declarou.
Com a presença de mais de 90 comunidades confirmadas, o evento é aguardado com ansiedade o ano todo. Para as lideranças presentes, os dias de festival representam um vital recarregamento de energias. Marlene Matheus observou que, apesar das dificuldades logísticas, como a questão do transporte, a edição foi "maravilhosa" e essencialmente fortalecedora. "Esse encontro fortalece nossas lideranças, que voltam para seus territórios com mais energia para continuar seus trabalhos,” explicou, evidenciando o papel multiplicador do festival.
Programação Compartilhada: Arte e Debate Nascidos da Comunidade
Um dos pilares que garante a autenticidade e a profundidade do Fala Quilombo é seu modelo de curadoria. A programação não foi imposta por um olhar único e centralizado, mas sim construída coletivamente através de um processo compartilhado entre artistas, coletivos culturais e as próprias lideranças comunitárias.
Essa abordagem garantiu uma rica tapeçaria de atividades, refletindo a diversidade dos povos ali reunidos. O público pôde participar de oficinas práticas, como graffiti e pintura afroindígena, que são formas de reocupação estética do espaço urbano e de preservação da memória visual. O festival também contou com uma intensa agenda de apresentações culturais e shows, que trouxeram para o palco a música, a dança e as narrativas dos diferentes territórios. Além da arte, as rodas de conversa e os debates promoveram trocas de saberes e estratégias de atuação política, reafirmando o caráter formativo e mobilizador do Festival Fala Quilombo.
www.portalmagoonews.online