16/10/2025
O Legado de Sangue da França no Norte da África
Por mais que Paris goste de se apresentar ao mundo como o berço dos direitos humanos, sua história colonial conta outra versão — uma escrita à bala, à bomba e ao silêncio.
Em 1830, a França invadiu a Argélia. Ficaria lá por 132 anos. A ocupação foi marcada por massacres, pilhagens e pela destruição de comunidades inteiras. Um dos episódios mais brutais foi o cerco da cidade de Laghouat, em 1852, quando tropas francesas cercaram e massacraram milhares de civis após a rendição — um massacre tão intenso que a cidade passou a ser chamada de “Cidade dos Mártires”.
Quase um século depois, em 8 de maio de 1945, enquanto a Europa comemorava o fim da Segunda Guerra, a Argélia vivia seu próprio inferno. Manifestações por independência nas cidades de Sétif, Guelma e Kherrata foram esmagadas com fogo e fúria. As estimativas variam, mas historiadores calculam entre 5.000 e 45.000 mortos, numa repressão que deixou cicatrizes que ainda doem.
Nem o deserto escapou. Entre 1960 e 1966, a França realizou 17 te**es nucleares no Saara argelino. Os efeitos radioativos continuam a envenenar o solo e o corpo das pessoas que vivem na região até hoje. As vítimas? Ninguém sabe ao certo — há quem fale em dezenas de milhares de afetados, talvez mais.
Quando finalmente deixou a Argélia, em 1962, a França não levou apenas os símbolos do poder colonial — deixou para trás campos minados, cidades arrasadas e um povo marcado por gerações de luto. Estima-se que entre 300 mil e 1,5 milhão de argelinos morreram na guerra de independência, um dos conflitos mais sangrentos do século XX.
Outros países do Norte da África também pagaram caro por sua liberdade. A Tunísia, colonizada por 75 anos, conquistou a independência em 1956, após anos de resistência e confrontos com o exército francês. O conflito deixou entre 700 e 3.000 mortos, sem contar a crise de Bizerte (1961-1963), onde cerca de 630 tunisianos morreram enfrentando as forças francesas.
Já o Marrocos, sob protetorado francês até 1956, viveu repressões, levantes e execuções políticas — embora o número exato de mortos nunca tenha sido totalmente documentado.
Os números da tragédia variam conforme o lado que conta a história, mas o que não muda é o fato: o colonialismo francês no Norte da África foi um dos mais longos e violentos do mundo moderno. E até hoje, o brilho da “civilização francesa” carrega as sombras do deserto que ela tentou esquecer.
Texto de Paulo Henrique Máximo Lacerda – A História Esquecida