29/10/2024
O QUARTO AO LADO
(FILME NOVO DO ALMODÓVAR)
(Pode conter spoilers)
A grande beleza do cinema é que ele parece mesmo um universo sempre aberto. Como a vida, como a existência, e da mesma forma que um filme sempre tem um fim, Almodóvar nos coloca com máxima clareza que tudo pode ter um fim, inclusivo a nossa própria existência, e em certos cenários, por vontade própria. É o que o filme nos coloca, explorando cuidadosamente e poeticamente as dimensões desses bens e decisões, no que se inclui a relação entre duas amigas, uma, Ingrid (Juianne Moore), escritora renomada cuja escrita última e bem sucedida revela seu pavor pela terminalidade de vida, e Martha (Tilda Swinton), que trata um câncer metastático de colo uterino e que entra em uma fase pessimista e descrente do tratamento de sua doença avançada.
Martha é uma jornalista que especializou-se em cobertura de guerras tendo capturado boa fama pela sua obra tem uma filha com um veterano do Vietnam que por sua vez traz traumas de guerra que determinam seu destino mórbido e respingam por toda a vida de Martha e sua filha. Damian surge inicialmente como um sujeito oculto cujas paixões se***is foram compartilhadas pelas duas amigas em momentos diferentes, representa o sempre presente instinto selvagem de Almodóvar, e materializa-se posteriormente como um cientista apavorado e impaciente com o fim do mundo pela catástrofe climática em curso, e como um amigo sereno e extremamente leal, contrastando interessantemente com sua vida juvenil.
Os diálogos são intensos, lentos, em um ritmo à moda antiga (que amo) que permite a digestão e a plena compreensão de sua densidade e dos dilemas morais expostos a sangue frio, mas em um conjunto de “maturidades” que talvez sejam o natural reflexo de um diretor de carreira indiscutível e marcante que parece traduzir nesta obra o seu próprio sentimento de maturidade. Aliás, penso mesmo que a essência deste filme é a maturidade, a independência e a coragem frente a vida e frente ao seu fim.
Do Almodóvar mais jovem, persiste a linguagem cinematográf**a na qual se destaca a inconfundível paleta de cores e contrastes, reconhecíveis facilmente a muita distância. De Tilda Swinton, um desempenho digno de um Oscar, de tirar o fôlego.
Um filme imperdível, não deixem de ver. E preparem-se, sairão diferentes da sala.
NN