
27/05/2025
Levei-a até o rio,
pensando que era moça livre,
mas tinha marido.
Era noite de Santiago.
E quase por destino.
As luzes se apagaram —
e os grilos se acenderam.
Nos cantos últimos do mundo,
toquei seus seios adormecidos.
E eles se abriram,
como ramos de jacintos
despertos pela tempestade.
O amido do seu sangue
soou no meu ouvido,
como seda rasgada
por dez facas afiadas.
Sem prata nos copos do céu,
as árvores cresceram como lanças
e um horizonte de cães
latia longe, muito longe,
do lado escuro do rio.
Depois das amoras,
dos espinhos e dos juncos,
sob o seu cabelo derramado,
abri um sulco na limousine da noite.
Tirei a gravata.
Ela, o vestido.
Eu, o cinto com revólver.
Ela, quatro sutiãs.
Nem os nardos, nem as conchas,
têm pele tão fina.
Nem os cristais à luz da lua
brilham com tal brilho.
Suas coxas fugiam de mim
como peixes assustados,
metade feitas de fogo,
metade feitas de frio.
E naquela noite, eu corri
o melhor dos caminhos:
montado numa potra de nácar,
sem freios, sem estribos.
Não direi, por ser homem,
as coisas que ela me disse.
A luz do entendimento
faz-me calar com respeito.
Suja de areia e beijos,
tirei-a do rio,
enquanto o vento fazia vibrar
as espadas dos lírios.
Agi como quem sou —
um cigano verdadeiro.
Ofereci-lhe um grande presente:
um vestido de cetim palhaço.
E eu… eu não queria me apaixonar.
Mas ela —
ela, que era casada —
jurou ser moça livre
naquela noite
em que a levei até o rio.
— Federico García Lorca, Romanceiro Cigano (1928...