23/05/2025
NO FIO DA NAVALHA
Por: Marcelo Medrado
A contravenção na Baixada Santista vem navegando em mar de Almirante quando se trata de combater suas atividades ilícitas. Principalmente, o Jogo do Bicho. Desde antanho, quando os encontros entre delegados e contraventores aconteciam em restaurantes e bares na Vila Nova e até na Boca do Lixo. Os acertos se faziam de forma a não confrontar as autoridades maiores.
Muitas vezes se via jantando no mesmo restaurante e, até na mesma mesa, os antagonistas da rua. Esse tempo já passou e, em sua maioria os personagens também já se foram. Alguns ainda esperam a compulsória.
Porém, o que mais se vê pelas ruas são os cambistas com seus terminais POS – Point of Sale – em bares e até no meio da rua. Mesmo sendo de conhecimento geral, nada acontece! Se veem até mesmo policias fardados almoçando ao lado dos cambistas. E pessoas apostando como se nada estivesse acontecendo.
Par em passo, a postura da polícia judiciária, responsável pela investigação, é cada vez mais latente. Policiais sem a presteza adequada assumem o comando de delegacias e inquéritos imprescindíveis para o controle da violência na sociedade. Demonstram essa tibieza em cada ação ou inação quando no comando.
Um exemplo dessa postura profissional foi o inquérito promovido pelo delegado de 2ª classe, Raphael Peixoto Barazal Teixeira e sua equipe na 1ª DIG – Delegacia de Investigações Gerais – DEIC/Santos. Onde após mais de 2 anos de investigações, só conseguiu encontrar o pai do contraventor já falecido há 14 anos.
TÁ NO POSTE!!
Tudo se inicia com uma denúncia via “Disque Denúncia” do MPE – Ministério Público Estadual – onde uma pessoa que se identifica como Cesar aponta um esquema de cooptação de pessoas para indicação de “pontos” de jogos ilegais. No material enviado ao MPE havia a informação de que estariam instalando pontos de jogos ilegais nos bairros Samaritá, Portelinha e Fazendinha. Bairros situados na área continental de São Vicente. O panfleto ainda prometia as pessoas um pagamento de R$ 50 por indicação de jogo do bicho, caça-níquel e Bingo TV. Segundo a denúncia o operador desses equipamentos seria um indivíduo chamado Maneco ou Manequinho.
No bojo da denúncia era o conteúdo: “Carlos virtuoso está preso por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha e continua recebendo dinheiro das apostas pois arrendou seus pontos na Baixada para o Maneco conhecido como Manequinho o dinheiro das bancas são repassando para a família de Carlinhos pelo advogado do próprio junto com advogado do Maneco e outra parte da cidade de São Vicente e arrendada pela facção criminosa PCC junto a Carlos virtuoso. O que deseja do MP: Investigação e conter esse bandido pois está cada vez mais rico e tirando dinheiro dos outros.”
Neste sentido, a Promotoria de Justiça remeteu a denúncia para a polícia judiciaria que abriu o inquérito para a apuração em 23 de março de 2023 na 1ª DIG-DEIC-DEINTER6 sob a competência do delegado Raphael Peixoto Barazal Teixeira e a escrivã Ana Lúcia de Souza Abelha. Nesse sentido, é importante afirmar que a condição da escrivã é relatar todos os procedimentos apurados. Entretanto, se faz necessário que o leitor tenha atenção neste nome.
Apesar de constar no panfleto os telefones sem DDD e se usarem da lógica de que seriam todos de código 013 os resultados para as pesquisas foram, no mínimo, estranhos. Todos os nomes constantes no panfleto não conferiam com os resultados das informações cedidas pela empresa telefônica.
Apesar deste detalhe, o delegado conseguiu que um dos identificados fosse localizado e desse depoimento. Isso depois de algumas tentativas, muitas dilações de prazo e cobranças do MPE. Onde a expedição da primeira intimação se deu em 30 de outubro de 2023. Sendo ouvida em 27 de dezembro de 2024. A depoente afirmou não saber nada sobre o assunto da linha telefônica e nem mesmo sobre a questão dos panfletos digitais que tratavam da contravenção.
CAPACIDADE SINGULAR
Incrivelmente os investigadores, sob o comando do delegado Raphael Barazal, conseguiram, em um trabalho de campo excepcional, com fontes nas ruas identificar o contraventor apontado na denúncia: Manoel Rodrigues, o Maneco. Com mais alguns meses de trabalho árduo também conseguiram locais onde Maneco teria mantido suas atividades criminosas. Mais ainda, descobriram que Manoel Rodrigues estava morto desde 2011. Porém, não conseguiram identificar que “Manequinho” é o filho do falecido e, este sim, responde pelo apelido de “Manequinho”. Inclusive os endereços apontados nos relatórios são ligados a atividade do filho e não do falecido.
Quanto a Carlos Virtuoso, a equipe conseguiu determinar que este permanecia preso. “No mais, CARLOS VIRTUOSO “encontra-se preso há mais de 10 anos fruto de Sentença Condenatória e recolhido em um Centro de Detenção Provisória na cidade de São Paulo e tendo em vista que Manoel Rodrigues é falecido desde o ano de 2011 não encontramos fatos que liguem tais pessoas” – aponta o relatório.
Entretanto, uma carta encontrada em um notebook apreendido durante a “Operação Game Over”, realizada pelo GAECO – Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado – do MPE em 2017. Aponta a relação entre Manequinho, Manoel Rodrigues Junior, e Carlos Virtuoso. Na carta, escrita pelo proprietário do notebook, o subscritor aponta a relação comercial com Carlos Virtuoso.
Diz a carta:
“OLA CARLINHOS TD BEM!
NECO FALANDO, ESTOU ENVIANDO ESSA CARTA, PQ AQUI ESTÁ UMA PALHAÇADA, QUANDO ASSUMI O COMBINADO FOI 60% SEU E 40% MEU DO LIQUIDO AGORA ELES QUEREM 400 MIL MENSAL, POR CAUSA DAS DESPESAS QUE TEVE NO MÉS ANTERIOR, QUANDO PEGUEI FOI FALADO PARA PAGAR TODAS DIVIDAS QUE TINHA NA RUA, ESTAVA UMA BAGUNÇA, TEVE MUITO ROUBO, FOI DITO QUE TINHA 120 MIL NA RUA, MAIS NÀO TINHA, O QUE TINHA MESMO ERA MUITO PAGAMENTOS QUE NÃO FOI PAGO, ISSO PQ SO PAGUEI DIA 28,29,30 E 31 E TEM MUITA GENTE RECLAMANDO DO MÉS DE DEZEMBRO, QUE SEUS FUNCIONARIOS FOI NOS LOCAIS PEGAR O DINHERO E NÃO MANDAVA OS PAGAMENTOS, INCLUSIVE ALGUNS TIROU DO SEU BOLSO PARA PAGAR, E ARRUMEI ISSO, CLARO QUE FALTA ALGUNS AINDA PQ É MUITA COISA ELES NÃO PAGARAM NEM A DESCARGA ESTÃO DEVENDO MUITO, E AGORA ELES QUEREM PEGAR NOVAMENTE SE EU NÃO PAGAR OS 400 MIL, SE FOR DO SEU ACORDO ATE PAGO OS 400 ME MAIS NA HORA QUE TIVER OS PREJUISOS ALTO TEM QUE SER DIVICO, TEM MUITA COISA QUE ELES ESTÃO FAZENDO DE ERRADO, TIPO COLOCAR SO FAMILIARES DELES & CAFETINAR, MES PASSADO TIVE MUITO GASTO SIM PQ MONTE OUTRO ESCRITORIO, COMPREI MOTO, MAIS O QUE COMPREI TENHO NOTA E NA HORA QUE DEVOLVER VAI TD JUNTO COMPREI 3 MOTOS PQ NÃO TINHA COMO TRABALHAR OS FUNCIONARIOS NÃO DEVOLVERAM NEM ISSO, ESTOU LHE ENVIANDO O RELATORO E SE POSSIVEL QUERO QUE ESCREVA UMA CARTA DIZENDO REALMENTE O QUE VC QUER, PARA PODER RESOLVER ISSO, FOMOS CRIADO PELOS NOSSOS PAIS QUE A PALAVRA DE HOMEM NÃO VOLTA ATRAS, ENTÃO EU COMPRI COM A MINHA ATÉ O MOMENTO MAIS DA FORMA QUE SE ENCONTRA F**A DIFICIL, PQ TD MUNDO QUE SO GANHAR O SEU E RESOLVER OS PROBLEMAS QUE E BOM NADA, SE VOCE ACHAR QUE ESTOU ERRADO POR FAVOR ESCREVE QUE DEVOLVO NO MÉS QUE VEM, OU SE QUISER CONTINUO ADMINISTRANDO CONFORME O COMBINADO E TAMBÉM QUERO QUE COLOQUE O NOME DE UMA PESSOA DE SUA CONFIANÇA PARA F**AR NO ESCRITORIO E PARA PEGAR O DINHEIRO NO COMEÇO DO MÊS” (Transcrita dos autos)
Após todos os indícios e possibilidades de se levar a investigação á frente. Em 05 de maio de 2025, dois anos depois de iniciado a apuração, o MPE se manifesta nos autos pelo arquivamento do inquérito. Apontam os promotores: “De qualquer modo, e não obstante a existência de informações que indicam a ocorrência de fatos ilícitos, tais informações já são ou foram objeto de investigação em outros autos. Neste IP, nenhuma prova foi produzida. Nem sequer se identificou o MANECO (filho) que já havia sido denunciado. Sendo assim, outra solução não há senão o arquivamento do presente inquérito, com as ressalvas do art. 18 do CPP.”
TIC TAC
Indiciado na operação Game Over em 2017, Manoel Rodrigues Junior, responde processo, que tramita no Fórum de Santos, por lavagem de dinheiro, formação de quadrilha ou bando armado e outras acusações. Durante a operação, o Ministério Público Estadual, apreendeu mais de R$1 milhão, US$8 mil e €$2 mil em dinheiro; oito armas de fogo, duas granadas, cinco carregadores, uma máquina de choque, centenas de munições e materiais relacionados à exploração do jogo do bicho. Também foram indiciados suas irmãs e cunhado.
Sua audiência está marcada para ocorrer em 24 de junho próximo. Apesar de muitos contratempos processuais em que alguns dos réus permaneceram sem advogados por muito tempo, depois de 8 anos irá se iniciar o julgamento. As expectativas do MPE público são baseadas nas provas adquiridas, a condenação dos réus. Dentre eles, Manequinho.
Segundo o promotor do GAECO, Silvio de Cilo Loubet, nesta audiência “serão ouvidas as testemunhas arroladas pelas defesas (no total de 25) e serão realizados os interrogatórios. Minha expectativa é apenas que seja possível encerrar toda a prova oral nessa audiência para prosseguirmos com vistas ao julgamento do processo.” A expectativa do MPE é obter a condenação dos envolvidos num prazo de 30 dias após a audiência.
Nesse sentido, Manoel Rodrigues Junior, deve passar a pertencer ao hall da fama dos condenados pelo GAECO/Santos. Se juntando a personalidades como Carlinhos Virtuoso, Vitor Dias Maia (Anão), Walter Sereno, dentre outros.
Entretanto, a defesa de Maneco, promovida pelo advogado Eugênio Carlo Balliano Malavasi, se manifestou afirmando que “a defensoria técnica aguarda com serenidade, o inicio da instrução processual a guisa de provar a inocência de nossos constituintes”.
O QUE DIZEM AS PARTES
O atual delegado da DIG/Santos, respondeu que: “as informações à imprensa devem ser dirigidas diretamente a Assessoria de Imprensa do Deinter 6 padrão que foi estabelecido já há tempos. Quanto a investigação em si desconheço o conteúdo pois assumi a unidade em 5 de maio pp. e, portanto, nunca esteve sob minha responsabilidade. Espero ter ajudado com as informações que tenho no momento.”
Procurada a assessoria de imprensa do DEINTER-6, Ana Lúcia de Souza Abelha, escrivã responsável pelo inquérito à época, respondeu: “tais solicitações deverão ser solicitadas a Assessoria da Secretaria de Segurança Pública.”
Questionado o promotor Silvio de Cilo Loubet, afirmou que, neste caso, já não tinha mais nada a acrescentar.