21/07/2024
40 Anos Festival de Música da Baía das Gatas versus Festival de Woodstock
O Festival de Woodstock foi um empreendimento comercial de quatro jovens amigos que resolveram aplicar o seu dinheiro em um grande espetáculo musical sob as égides de paz, amor e música, para ganhar dinheiro. Tiveram sorte: afluíram 400.000 pessoas, a 18.000 dólares cada, e ficaram milionários. O que aconteceu depois foi espontâneo. O pessoal jovem, que procurava espaços de liberdade e diversão, afluiu todo e marcou o festival espontaneamente, com forte contradição aos costumes da época.
Quanto ao Festival de Música da Baía das Gatas, o objetivo embrionário que nos moveu foi diferente. Em primeiro lugar, o embrião do FBG fomos nós, músicos, e não empreendedores comerciais com fim lucrativo. Na Baía, sob minha proposta, porque a necessidade, a motivação era reivindicar nosso espaço no quadro da cultura musical da terra, considerando que, por fazermos uma música que não era nem morna, nem coladeira, nem funaná, por fazermos uma música criativa, livre, diferente dos nossos gêneros tradicionais, éramos oficialmente preteridos e considerados culturalmente alienados. Essa foi a motivação embrionária e a razão que nos levou a escolher precisamente a Baía das Gatas, uma praia frequentada pelos políticos e a classe dominante da ilha todos os fins de semana, e não uma quinta no interior da ilha, ou a Laginha, ou Monte Sossego, ou a Praça Nova, como era a proposta do Vasco. É que o Vasco estava focado na fama do grupo, nas áreas onde haveria maior público. Eu estava focado na conquista de espaço cultural e reconhecimento.
O Festival Baía das Gatas nunca foi um empreendimento comercial com enfoque em ganhar dinheiro. Foi embrionariamente uma absoluta intenção de expansão de liberdade cultural, musical e alargamento do pensamento nessa perspetiva, apenas. O pessoal jovem fã do espírito livre dos anos 60, que abraçaram o projeto no arranque, na altura, apenas, assíduos, fãs e colaboradores do Vasco e da Galeria para a gestão de bar, logística de cartazes, portaria e limpezas, “incorporaram-no” esse espírito de liberdade que na altura ainda reinava.
Portanto, as motivações embrionárias dos dois festivais foram diferentes. Porém, embora realizados com 15 anos de distância, o Festival de Woodstock influenciou sim o Festival da Baía das Gatas, mas seguramente não foi ele que embrionariamente motivou a realização do Festival de Música da Baía das Gatas. A ideia, a determinação de fazer os concertos na Baía já havia sido solidificada por nós, músicos, eu, Vlu Ferreira, Vasco Martins, Lúcio Vieira, Bulimundo e Tony Miranda, que era no momento a banda, antes do rótulo Gota D’Água, que brilhava nas noites de música ao vivo da Galeria Nho Djunga, desde 1982. O Cooks apenas sugeriu que se lhe chamasse Festival da Baía, e a partir daí foram incorporadas influências do Festival de Woodstock, nos vários encontros e momentos que antecederam o dia D do Festival, sob o comando do primeiro presidente da organização, Daniel Medina, coadjuvado por uma multidão de apaixonados colaboradores, entre os quais é importante destacar o Engenheiro Gabriel Évora.
A multidão de jovens que abraçou o projeto e colaborou apaixonadamente na realização do primeiro Festival de Música da Baía das Gatas dá um livro de efeitos e fatos que seria bom escrever.
Texto por: VLU FERREIRA