05/05/2025
𝗝𝗢𝗥𝗡𝗔𝗟𝗜𝗦𝗠𝗢 𝗘𝗡𝗧𝗥𝗘 𝗔 𝗗𝗘𝗦𝗢𝗥𝗚𝗔𝗡𝗜𝗭𝗔ÇÃ𝗢 𝗘 𝗟𝗜𝗕𝗘𝗥𝗗𝗔𝗗𝗘 𝗗𝗘 𝗜𝗠𝗣𝗥𝗘𝗡𝗦𝗔 𝗡𝗔 𝗚𝗨𝗜𝗡É-𝗕𝗜𝗦𝗦𝗔𝗨
A Guiné-Bissau enfrenta um cenário singular e complexo no que concerne ao exercício do jornalismo. Se, por um lado, clama-se por mais liberdade de imprensa, por outro, emerge uma questão fundamental e intrínseca à própria organização da classe jornalística: o problema reside primordialmente na falta de liberdade ou na desestruturação e politização do setor?
Um dos factos mais distintivos da atual realidade é a permissividade com que indivíduos se autoproclamam jornalistas, um fenómeno único a nível mundial. Esta abertura, embora possa parecer inclusiva à primeira vista, contribui para um ambiente onde a profissionalização e a adesão a princípios éticos basilares do jornalismo são frequentemente negligenciadas.
Dizia o professor António Nhaga " Na Guiné-Bissau, só múdo kuka pudi sedu jornalista, ou seja, na Guiné-Bissau, só mudo que não pode ser jornalista"
A confusão terminológica e a falta de critérios claros para a identificação de um jornalista profissional na Guiné-Bissau permitem que indivíduos que atuam em diferentes esferas da comunicação sejam indistintamente rotulados como jornalistas.
Esta imprecisão não apenas desvaloriza o trabalho dos verdadeiros profissionais, como também pode gerar equívocos perigosos na opinião pública, especialmente em casos sensíveis como o da suposta violação de uma estudante por seu "professor" que ilustra, de forma alarmante, a urgência de uma clarificação e organização da classe jornalística no país.
Apesar de informações indicarem que o indivíduo em questão apresenta um programa de caráter interativo numa rádio – inserindo-o na terceira dimensão da comunicação, a radiodifusão –, a difusão da notícia em alguns órgãos e, sobretudo, nas redes sociais, associa-o diretamente à figura de um "jornalista que violou sua aluna".
Esta categorização levanta uma questão crucial: o suposto agressor é, de facto, um jornalista no sentido profissional e ético do termo? A resposta, com grande probabilidade, inclina-se para o negativo.
O silêncio da classe jornalística organizada diante desta situação é particularmente notável e preocupante. Nenhuma voz oficial, salvo erro, se levantou para esclarecer a distinção entre as diferentes dimensões da comunicação e para desvincular a figura do suposto agressor da identidade de um jornalista profissional.
Esta omissão permite que a opinião pública generalize e associe um ato criminoso individual à totalidade da classe jornalística, manchando a reputação dos profissionais que atuam com ética e responsabilidade.
A ausência de um posicionamento claro por parte das organizações representativas dos jornalistas da Guiné-Bissau, neste caso específico, levanta sérias questões sobre o papel e a eficácia destas entidades na defesa da integridade da profissão.
O caso da suposta violação não deve ser apenas um episódio isolado de indignação. Ele deve servir como um catalisador para uma profunda reflexão sobre a necessidade de organização, profissionalização e clareza no setor jornalístico da Guiné-Bissau.
𝗟𝗶𝗯𝗲𝗿𝗱𝗮𝗱𝗲 𝗱𝗲 𝗜𝗺𝗽𝗿𝗲𝗻𝘀𝗮
A discussão sobre a falta de liberdade de imprensa ganha contornos ainda mais complexos quando se observa a atuação de jornalistas no ativo que, simultaneamente, desempenham funções de assessores de imprensa para diversas lideranças políticas e ministérios. Mais alarmante ainda é a sua participação ativa nos gabinetes de comunicação de partidos políticos durante eventos de natureza partidária.
Esta prática, além de violar os princípios de independência, objetividade e imparcialidade que regem o jornalismo, expõe os profissionais a potenciais conflitos de interesse e suscita dúvidas sobre a credibilidade da informação veiculada. Em muitos ordenamentos jurídicos e códigos de ética da profissão, tais condutas seriam passíveis de sanções disciplinares.
Diante deste panorama, torna-se imperativo questionar se a principal barreira ao desenvolvimento de um jornalismo robusto e credível na Guiné-Bissau reside unicamente na falta de liberdade de imprensa ou se a desorganização interna da classe, permeada por fortes sentimentos político-partidários, não representa um obstáculo ainda maior.
É inegável a importância de um ambiente que garanta a liberdade de imprensa e proteja os jornalistas de pressões e represálias. No entanto, a ausência de uma estrutura profissional coesa e a promiscuidade entre a atividade jornalística e os interesses político-partidários minam a confiança pública no jornalismo e comprometem a sua função essencial de fiscalizador do poder e provedor de informação fidedigna.
Daí, a meu ver, urge, portanto, uma reflexão profunda e a implementação de medidas concretas por parte das diversas organizações defensoras da classe jornalística do país.
Não basta apenas emitir comunicados de condenação perante eventuais violações da liberdade de imprensa. É crucial que estas organizações abordem, de forma transparente e corajosa, os problemas internos que corroem a credibilidade da profissão.
A defesa da liberdade de imprensa deve andar de mãos dadas com um esforço concertado para organizar e fortalecer a classe jornalística, garantindo que os profissionais atuem com independência, rigor e compromisso com a verdade, repito apenas com a verdade.
𝗠𝗶𝗻𝗵𝗮 𝗰𝗼𝗻𝘁𝗿𝗶𝗯𝘂𝗶çã𝗼
𝗕𝗼𝗮 𝗹𝗲𝗶𝘁𝘂𝗿𝗮...