15/10/2025
Jorge Rodrigues
O que foi a NACIONAL 2 NONSTOP...
Uma estrada enorme que nos faz sentir pequenos....
A partida estava planeada para a manhã do dia 15 de Agosto.
Às 7:30, ali estávamos, na rotunda do quilómetro Zero da Estrada Nacional 2 para aquilo que seria o início de uma lição de humildade.
O início foi bastante tranquilo, com um céu carregado com uma nuvem de fumo, que me acompanhou até Álvares, mas que não foi impeditivo de fazer acontecer.
As primeiras montanhas foram sendo ultrapassadas sempre com um ritmo bastante tranquilo e numa enorme gestão de esforço para que o corpo se fosse adaptando e não viesse a sofrer quebras nesta primeira parte montanhosa do percurso.
Da Régua até Castro de Aire a temperatura foi subindo e a densidade do fumo foi também aumentando, começando a provocar algum desconforto pulmonar, mas nada insuportável.
A quantidade de cinzas que estavam a cair começavam a deixar todo o equipamento, e pele, com uma pasta de suor e cinza que dificultava o arrefecimento do corpo, mas os quilómetros iam passando e as notícias que iam chegando sobre a evacuação da concentração de Góis, a quantidade de incêndios e a possibilidade da Nacional 2 ser fechada ao trânsito, deixavam uma incerteza sobre a continuidade desta aventura.
Em Penacova, depois de uma paragem num pequeno café onde procurámos recolocar o Live Tracking em funcionamento e comer 2 gelados foi seguir com a travessia no meio de milhares de Motos que circulavam neste final de sexta feira depois da evacuação da concentração.
Gois ficava para trás e vinha a serra da Lousã, com uma vertente em chamas e uma densidade de fumo que dificultava a respiração, mas com o foco em Pedrógão Grande.
Aí chegado, uma paragem mais prolongada para abraçar a minha família, respirar fundo para controlar as emoções, tomar uma chuveirada portátil, trocar de equipamento e montar iluminação para depois de uma massa com ovo, que ia ter de dar até Abrantes, foi o momento de seguir caminho.
Até Abrantes as horas e o alcatrão foram passando num troço de estrada larga, que convida os automóveis a andar e onde possivelmente me senti mais inseguro durante toda a viagem.
Em Abrantes mais uma paragem para abastecimento e uma massagem, vestir um corta vento e seguir viagem.
Foram horas de falso plano, de vilas perdidas no meio do Alentejo, de um Lince Ibérico na sua vidinha e de uma temperatura formidável para se poder pedalar.
Durante a noite fizemos algumas paragens para Abastecimento porque neste momento o corpo já não conseguia processar com facilidade tantas horas de esforço.
A Manhã aparecia no Ciborro, no marco do quilômetro 500 onde paramos mais uma vez para recuperar fôlego, beber café e desmontar toda a iluminação.
A entrada no segundo dia foi tranquila, um ar fresco das 7 da manhã com um sobe e desce constante, em que conseguia rolar a uma média razoável, mas que não anunciava o que aí vinha.
A meio da manhã o sol já queimava, o ar quente já obrigava a um maior consumo de líquidos e a vontade de comer cada vez era menos, mas o objetivo estava ali a menos de 200kms.
Na zona de Ferreira do Alentejo encontrei o Daniel, ciclista da Casa do Benfica de Almodôvar, que se voluntariou para fazer um trabalho de gregário de luxo e que me levou à roda até Almodôvar. Durante esses 60 quilómetros não existem muitas sombras, existia sim um vento quente de frente que teimava em dificultar tudo e que em grande parte do tempo fazia o GPS registar sensações térmicas de 48 graus celsius e que só foi possível ultrapassar desta forma porque o Daniel estava ali na frente a cortar todo o vento que conseguia e a Ana e a Isabel a dar água a cada 10 minutos e com um pulverizador a fazer tudo para que a temperatura se tornasse um bocadinho mais aceitável.
Em Almodôvar paramos, comemos e deixamos o Daniel com uma promessa de treinos futuros e seguimos para os 75 quilómetros que restavam.
Entrava na Serra do Caldeirão com menos vento mas com o mesmo calor, mas nesse momento o calor já não era importante, nesse momento já nem a serra que faltava ultrapassar era importante porque nesse momento lembrava-me de todas as mensagens que a Ana leu de dezenas de pessoas que não sei quem são, outras tantas das minhas pessoas que seguiram dia e noite. Lembrava-me do texto do Fernando Mendes que na paragem em Penacova já me quebrava emocionalmente enquanto ali ao lado estava a nossa Lousã a arder, nesse momento o corpo já só seguem os pensamentos e quando dei por mim estava a descer São Brás de Alportel a pouco mais de 20 minutos da chegada.
Parei a bicicleta na mítica rotunda que marca o fim desta travessia e pergunto se "tenho necessidade de fazer isto ao meu corpo e à minha mente!?"
_Sim tenho, serve como exercício para as dificuldades reais que a vida nos coloca.
Obrigado Ana Saborano e Isabel Batista , por tudo o que fizeram e por tudo aquilo que são, não tenho forma de agradecer... Com o passar dos tempos vou agradecendo com a nossa amizade.
Daniel Ramos, quando estiveres nos campeonatos do mundo de Granfondo na Austrália vou estar a torcer por ti, és uma máquina.
Até já.... Tenho de ir treinar.
Números:
Quilometragem: 715km
Tempo total: 34 horas
Tempo Pedal: 28h 32 min
Velocidade média: 25.2km/h
Altimetria: 8792 metros
Media W: 110
Temperatura max: 48°
Temperatura min: 16°
Calorias: 14800