13/06/2025
Sexualidade e limitação motora é tabu. Quanto menos se fala mais se esconde
Entrevista realizada por alunas Universidade da Maia - UMAIA de Comunicação:
Maria Sousa Silva & Sofia Fontes
Entrevistada: Sara Coutinho
Sara Coutinho defende que estar numa cadeira de rodas não é o fim da vida sexual. Como tal, desafia as mulheres nesta condição a aceitarem o corpo, a serem fortes e a assumirem quem são. Partilhando a experiência pessoal , procura dar alento e confiança e não tem dúvidas que, desta forma, será possível criar laços afetivos.
O “Projeto Sara Coutinho” é uma iniciativa em nome próprio que visa incentivar a autoestima e autoconfiança de pessoas com limitação motora e que aspira ser uma referência positiva para quem partilha a mesma condição. “Eu sempre quis ser uma pessoa interventiva nesta temática”, sublinha Sara que, sem tabus, aborda a sexualidade de pessoas com deficiência em Portugal.
Sara Coutinho durante a entrevista na Universidade da Maia
O tema continua a ser desconfortável para muitos. “A sexualidade das pessoas com deficiência é tabu. Quanto menos se fala mais se esconde, deixando de existir”, afirma Sara Coutinho. Apesar de viver a sua sexualidade de forma natural, sabe que o preconceito está à espreita em cada etapa da vida. “O grande tabu, em Portugal, é infantilizar a pessoa com limitação, achar que não é capaz de se relacionar. Existe uma visão estereotipada de que somos assexuados.”
Sara recusa-se a aceitar este rótulo. “A minha confiança veio de não permitir que os outros me tratassem dessa forma.” É por isso que dá a cara, a voz e participa em entrevistas de modo a quebrar tabus e mitos. “Sempre quis ser uma pessoa interventiva nesta área, mas cada caso é diferente”, reforça. O que a incomoda é claro: “ainda há a mentalidade opressora de pensarem que pessoas com deficiência não podem ter uma vida sexual.
A desinformação é geral, mas também se sente no círculo mais íntimo. “A ajuda profissional é muito importante, mas devia ser mais voltada para a família. Se não tiverem uma mente aberta, não permitem que a pessoa com deficiência tenha uma vida normal.
” Para Sara Coutinho, a autonomia também passa por saber impor limites, até mesmo dentro de casa: “para não ultrapassarem o nosso direito de viver.”
Também no contacto com os profissionais de saúde há estigmas. “Os médicos têm uma visão muito limitada na sua profissão, somos vistos como frágeis, se disser que quero ser mãe de certeza absoluta que vão pensar que não sou capaz.” Sara salienta que “devemos ser acompanhados com a mentalidade de que futuramente possamos ter filhos.”
Em Portugal, ainda se esterilizam mulheres com deficiência para não poderem ser mães. Segundo o Público, este procedimento já não é tão frequente, mas desconhecem-se os dados nacionais. Na Estratégia Nacional para a Inclusão das Pessoas com Deficiência 2021-2025 não é abordado este assunto.
Falar de sexualidade também é falar de aceitação. Foi este o caminho que Sara Coutinho percorreu desde o acidente que lhe mudou a vida. “No início, não tinha a coragem nem a força que tenho hoje. A minha enciclopédia de vida foi ver as pessoas que estavam na mesma situação que eu a terem uma vida normal.” Depois veio a realização: “quando percebi que conseguia ter uma vida normal, permitiu-me desmistificar a mim própria e aceitar o meu corpo.”
“Para mim não existe o normal. Só não consigo entrar em portas estreitas e subir escadas.” A limitação motora de Sara não a impediu de ter uma vida ativa. Viaja sozinha, saltou de paraquedas e praticou inúmeros desportos radicais. “Inclusão social é estarmos onde todas as pessoas estão. Não gosto de ser tratada como uma pessoa diferente”, sublinha a entrevistada.
A história de Sara Coutinho é marcada por um acontecimento que lhe mudou o destino. A partir daí, construiu um percurso de superação, tornando-se um exemplo de resiliência e dedicação à causa da inclusão. Abaixo encontra os principais momentos da vida da entrevistada.
“Consegui realizar-me como mulher”, revela Sara. Mas ainda há desejos por concretizar. “Gostaria de ser vista como uma pessoa livre pela sociedade.” Existe uma conotação negativa em torno da cadeira de rodas. No seu caso, foi precisamente o contrário: abriu portas e permitiu-lhe concretizar sonhos. “Sem ela não estaria aqui, por isso, a primeira coisa que gostava que mudasse em Portugal é a ideia de que ela é uma prisão.” A cadeira faz parte de quem é, define uma parte essencial da sua autonomia. “É a extensão do meu corpo. Independentemente de tudo, ela é a minha liberdade.”