28/08/2025
Domingo de manhã, 4 de Março de 1990. Imola. Um rapaz de dezoito anos, Massimo Bulzamini, tem um acidente de mota. A queda é feia: a coluna está estilhaçada, os pulmões recusam-se a funcionar sozinhos. F**a em coma. Os médicos dizem que não se sabe. Nunca se sabe.
Um deles acredita em sons. A teoria era simples: acordar um cérebro ferido com vozes queridas. Gravam mensagens, repetem-nas em cassetes. É patético; também é tudo o que resta. Descobrem a devoção por Ayrton Senna, o seu Deus. Contra todas as expectativas, o grande ídolo aceita. Vai ao hospital, fala-lhe em italiano, grava fitas: “Devi reagire, ti devi fare forza”.
A medicina tem bisturis; a fé tem gravações magnéticas. A esperança nunca passará de uma tecnologia rudimentar.
Sempre que fazia te**es em Imola, Ayrton passava pelo hospital, deixava outra mensagem. Em 1992, Massimo entra em coma consciente. Dão-lhe uma televisão ligada a uma bateria de barco, num grotesco improviso. Um dia, está a ver a Juventus quando o médico desliga o ecrã; logo a seguir entra Senna, em carne e osso, aquele sorriso que acabava com o escuro. É quase obsceno de tão bonito: o ídolo no quarto do mutilado.
Abril de 1994: Senna visita-o pela última vez. Vinte dias depois, na mesma cidade, a mesma pista, o mesmo hospital. Massimo vê o acidente em directo, ouve o helicóptero passar, sabe antes de todos, reza. Em vão. O seu salvador já não pode salvar-se.
Massimo morre em 2015, rodeado de enfermeiros que o amaram. Guardou sempre uma foto com Senna. Nunca a mostrou.